Pieces * Feitiço frágil

  

   Quando estou sozinha, observo tudo o que está à minha volta. Procurando inspiração, às vezes. Procurando respostas, noutras. Neste caso, procurei amor. O amor dos outros. Um amor que faz parte da minha vida, mas que não é meu. Procurei amor na maneira como se olham, como se tocam, como se falam, como comunicam pelos silêncios, como transformam insignificâncias em tudo. Como fazem que amor deles pareça meu, num instante só.
   Nem sempre o que parece ser amor o é. Pode ser farsa. Pode ser outra coisa disfarçada de amor. Quando se está de fora percebe-se esse tipo de coisas. Coisas más. Ou coisas boas. Como perceber que alguém está apaixonado e tenta que o seu sentimento passe despercebido. Missão cumprida para a pessoa envolvida. Um falhanço total para quem não é o alvo dessa operação silêncio. Amar é fácil. Falar disso é muito complicado. Falar do amor dos outros é simples. É simples, porque não é nosso. Hoje o amor é tudo menos meu.

   Vejo alguns que fogem do que sentem. Uns preferem esconder. Outros tentam demonstrar, mas da maneira errada. Nenhum dos três é feliz nas escolhas que faz. É bom ser testemunha dessas escolhas, más ou boas. É bom perceber que ainda existem razões para acreditar e que tatuar a palavra love atrás do meu pescoço não foi um acto de pura rebeldia. Serve para me lembrar que até eu costumava acreditar no amor. Que ele existe. Não aqui, talvez não ao virar da esquina. Mas muito perto. Tão perto que quase consigo tocar-lhe. E por entre este mar de azar. Um mar que me rodeia. Que afoga todos os que ousam fazer parte do meu mundo. Um azar temporário. Um feitiço fácil de quebrar. Frágil como eu. Frágil de tão forte. Uma fragilidade tão forte de tão frágil.
   Há esperança. Algures. Nem que seja no amor dos outros. Ou no amor que brilha nos meus olhos. Um brilho que me cobre cada vez que vejo o amor em pessoa. Sentado, ao meu lado, sussurrando-me ao ouvido: não desistas. E quando lhe pergunto, baixinho, do que é que há para desistir, ele responde, sincero, enquanto me olha nos olhos: não desistas de ti, muito menos do que acreditas e muito menos ainda do que sempre lutaste.