Pieces * Boneca de porcelana


  Frágil. Foi no que me tornei. Passado. Um passado recente e doloroso. Era tão frágil que parti. Partiram-me. Um primeiro golpe. Quase mortífero. Seguiram-se outros. Alguns piores. Eu não só deixei como ajudei. Fui-me partindo aos poucos. Não tive como pedir ajuda. Não porque não queria, mas porque não sabia como fazê-lo. A menina que era uma força da natureza, que deixava a sua marca por onde passava, que era independente e olhava para tudo de cima, uma superioridade saudável, desaparecera. Um desaparecimento não repentino, aos poucos, devagar.
   Demorou, mas ela voltou. Os princípios estão lá, a vontade também. O que também por aqui anda são as experiências, os erros e os medos. Erros e experiências que criaram exemplos do que acontece quando perdes a tua essência e quando deixas que te roubem o que és. Medos esses de que isto seja mais um ciclo e de que, mais tarde ou mais cedo, eu me torne novamente numa boneca de porcelana, perfeita de tão frágil. Uma luta minha, apenas e somente minha. Tudo depende de mim. Achar que não foi o meu maior erro. Pôr em causa o que sempre acreditei, duvidar do que sou capaz e culpar-me por coisas de que nem eu, nem ninguém, poderia ter antecipado, foram os erros que se seguiram. 
  
   A boneca está aqui, mas agora é ainda mais inteligente. Quando encontra os obstáculos, pára, pensa e escolhe. Contorna-o ou aproxima-se com cuidado. Não tem pressa, nem se apressa. Tem tempo para tentar perceber o que está para lá dos muros que a vida lhe coloca à frente.
   É uma boneca, que tem aspecto de boneca de porcelana.

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