Pieces * Princesa Peste
A minha infância foi uma infância muito feliz. Cresci nos meus avós maternos e só aos 3 anos é que comecei a ir para o colégio. Aquela casa era a minha casa. Foi onde eu aprendi tudo. Lembro-me de ajudar a minha avó no quintal. Adorava sujar-me. Tirar ervas e plantar flores. Lavava roupa no tanque, passava a vida a inventar novos jogos para me entreter sozinha. Lembro-me muito bem do dia em que entrei na sala das formigas no Patronato Nossa Senhora da Torre. Entravamos na primeira porta e havia um corredor amplo com cabides para pendurar os casacos e as mochilas. Estavam quase todos ocupados. Ao fundo havia outra porta que dava para a sala principal, uma sala enorme e pintada de azul bebé. No meio da sala havia um circulo de formigas pintadas no chão. Era ali que nos sentávamos todos.
A Diló e a Lála eram as educadoras e eu sempre fui uma das preferidas. Não tinha jeito nenhum para recortar, mas adorava arrumar a sala ao fim da tarde. Era do pior para comer, ainda sou, mas na altura era o terror. Alguém teve a brilhante ideia de enganar a criança. A minha mãe comprou uma caixa e disse que todos os dias me trazia o almoço de casa. Era tudo mentira. As cozinheiras punham a comida do colégio dentro da caixa e eu comia toda contente. Ainda agora me conhecem como a menina da caixa. Que vergonha!
A fedelha da minha irmã não demorou muito a nascer. Não me lembro dela bebé, mas lembro-me de a levar ao colégio com a minha mãe e ela berrar que nem uma desalmada quando íamos embora. Eu andava lá no ATL de tarde. O meu pai trabalhava perto e íamos as duas para lá no fim do lanche. Lembro-me que havia uma sapataria perto da loja do meu pai e a rapariga que trabalhava lá comprava-me sempre uma empada de frango na pastelaria do lado.
Segundo o que me contam, eu não ia muito com a cara da minha irmã. Chegou para matar. Roubou-me as atenções e os brinquedos. Estragava e perdia tudo. Tinha a mania só porque tinha o cabelo loiro e aos cachos. Metia-me um pó. Até me recusava a sair com ela de casa, porque já sabia o que me esperava. Pedia-me para lhe montar uma casa para as Barbies dela e depois de 1h a montar aquilo, brincava 30 minutos e já não queria mais! É preciso ter lata! Pior que isso era o "Oh Mila" e a Mulan aos sábados de manhã. Era sagrado! "Mãe quero ver um filme" "Vai lá escolher qual queres ver" "Quero este" Nem precisava de olhar para ver qual era. Era a Mulan, pela milésima vez... Eu só pensava: "Tirem-me daqui!". E lá estava ela durante 1h30 a ver aquilo. Sabia tudo de cor.
Agora as coisas são diferentes. Não vivia sem ela. É uma peste, continua a irritar-me profundamente, mas não seria o mesmo sem ela. É a minha confidente e eu sou a protectora dela. Vou até ao fim do mundo. Obrigada mãe e pai pela Princesa Peste!