Pieces * Abismo perfeito
Na vida existem coisas que são incompatíveis. Que não se misturam. Tipo água e azeite. Que se anulam. Que não conseguem coabitar. O amor e o orgulho são o exemplo de dois estados do ser que partilham essas características. No amor não podes querer ser orgulhoso. Não podes querer ter razão. Não podes querer ter poder. Não podes ter a última palavra. Tens de saber esquecer, perdoar e perder. Porque perder uma luta para o amor, é ganhar a guerra.
Já uma vez escrevi que no amor é preciso partilhar, é colocares o teu mundo à disposição. É vender a tua alma por meia dúzia de trocos e dares o teu coração como extra. Promoção leve dois, pague um. Pensa que mesmo nessas promoções ainda ficas com lucro. Nem que seja o lucro de que tentaste. Que foste mais forte e que muitos dos que estiveram no teu lugar desistiram a meio, por medo. Não de perder, mas com medo de se perder.
Amar é estares disposto a trocar o tudo pelo nada, num abrir e fechar de olhos e sem duvidar por um segundo. Porque na dúvida já tu vais estar. Deixares entrar o amor em casa, é condenares-te à dúvida permanente. O quê? Com quem? Onde? Porquê? Entre outras. É passares a ser alguém estranho. Com reacções e pensamentos fora do normal. É perderes a noção do tempo e do espaço. Do certo e do errado. Do bom e do mau. É deixares de ter centro de gravidade. É ganhares a capacidade de decifrar cada letra de cada música. É identificares-te com um silêncio. É caminhar sem destino, sem mochila às costas e sem mapa. É condenares-te ao abismo perfeito. Navegares sem âncora e sem capitão. Amar é amar perder-se.