Pieces * Sem querer

   Admito, o meu desejo é que um dia acabe, acabe e ponto. Sem ressentimentos, sem dúvidas ou insónias. Ultimamente tem sido impossível. Nunca é possível. Haverá sempre algo que deixei por fazer por escolha ou por falta de tempo. Haverá sempre alguém que me fará falta e estará longe. Haverá sempre uma razão para estar revoltada, outra para ficar triste  e uma para me sentir incompleta. A cama estará sempre fria e vazia. Mesmo quando estiver lá alguém à minha espera, pronto para me abraçar. Farei sempre a revisão da matéria dada e a agenda para o dia seguinte estará pronta. A agenda e não só. Porque alguém como eu, não acorda sem um plano estabelecido. Sem um objectivo. Sem saber que sapatos quer calçar e que caminho percorrer. Daí as insónias. 
   Os ressentimentos são o peso que cada um carrega. Com as duas mãos. Que enchem o coração de dor e passado. E que provocam as insónias e as dúvidas. Fáceis de destruir, mas difíceis de descobrir. É como se fossem transparentes e invisíveis. Sabemos exactamente onde estão, não conseguimos é alcançá-los. Quando nos damos conta, já são donos e senhores da nossa vida. Eliminá-los já não trará nada de volta. As dúvidas são o defeito da vida. Os "ses", os "mas", os "talvez", tornam imperfeita a perfeição. No fim, acabas por adormecer, apesar das insónias, aprendes com os ressentimentos, mas com as dúvidas, vives sem querer, só porque tem de ser.


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