Pieces * O 1º capítulo



Muitos já ouviram falar dele, alguns já o começaram a ler, poucos são aqueles que sabem do que fala. Numa noite de Verão, mais ou menos há 3 anos, não tinha que fazer e comecei a escrever. As ideias não paravam de aparecer e eram 4h da manhã quando me apercebi de que estava a escrever o meu livro.
Desde então nunca mais peguei nele.
Os quatro capítulos que tinha escrito continuavam à espera de um quinto e de um fim.
Hoje resolvi partilhar mais um pedaço da minha alma, literalmente.
Este é o primeiro capítulo do resto da minha vida...



* Sempre que ela se deixava levar pelos seus pensamentos, era ele quem lhe invadia a mente e a sugava para um mundo passado que agora parecia ser irreal. A felicidade que um dia tivera, o sorriso que hoje teima em aparecer e aquela vontade de lutar contra tudo e contra todos, estão agora envolvidos na vida triste de uma mulher derrotada e sem força para se erguer. Aquele homem tornava-a numa fonte de luz que iluminava todos aqueles que a rodeavam.


- Mãe estás bem? – pergunta Julieta, espreitando pela porta da cozinha.
Ela sobressaltada, responde muito rapidamente.
- Sim, estava apenas a pensar no que levar para a festa de hoje à noite.
- Leva o teu vestido verde. Ficas linda mãe. – diz ela com um sorriso. – Podes ajudar-me com os trabalhos de casa?
Olha-a muito carinhosamente.
- Claro que sim querida. Vamos para o teu quarto enquanto o pai não chega. Daqui a uma hora chega a Joana e eu tenho de me arranjar. – responde ela.
Subiram ambas até ao quarto e sentaram-se. Julieta olha para a mãe muito pensativa.
- Mãe és feliz com o pai?
Ela acena com a cabeça de modo a parecer convincente e acrescenta.
- Claro querida, porque não o seria?
Julieta encolhe os ombros e sorri. A pergunta ficou-lhe na cabeça e o motivo pelo qual a filha a fizera também.
Passado algum tempo a porta da entrada principal fecha-se e ouvem-se passadas pesadas.
- Mafalda! – ouve-se das escadas.
- Estamos no quarto da Julieta – responde.
Gustavo sobe as escadas e pergunta.
- Que fazem vocês as duas enfiadas no quarto a estas horas?! Não deverias estar a preparar-te para a festa. Quantas vezes terei de te dizer que é muito importante para mim chegarmos a horas.
- Podes ter um pouco mais de calma. Estou a ajudar a tua filha com os trabalhos de casa. – responde com voz áspera.
- Acho que é para isso que pago à Joana. A tua filha tem quem a ajude. Deixa-te de tretas e despacha-te.
Mafalda olha para a filha, beija-a na bochecha e levanta-se, dirigindo-se para o seu quarto.
Abre a porta do quarto e vê nele tudo o que sempre desejou. Pensa na vida que tem e sente que apesar de todo o luxo que a rodeia, a única riqueza que tem na vida é Julieta. Se não fosse ela o seu universo não faria sentido. Entra no quarto. Olha para o armário entreaberto repleto de vestidos deslumbrantes e pensa o quanto ingénua era quando pensava que era esta a riqueza que lhe traria felicidade.
A campainha toca. Julieta sai do seu quarto a correr dizendo:
- Mãe é a Joana. Eu vou lá.
Ela acorda de seus pensamentos e responde.
- Ok. Obrigada meu amor. Desce com cuidado.
Coloca o seu vestido verde-esmeralda e olha-se ao espelho. Pensa como deverá levar o cabelo e resolve deixá-lo solto e esticado. Pega nos seus brincos de diamantes e decide não os levar. Escolhe uma pulseira simples e pousa a pochete preta em cima da cama.
Julieta entra de rompante.
- Mãe está lá em baixo um senhor que quer falar contigo.
- Comigo?! – exclama surpreendida.
- Sim.
Um pouco intrigada responde.
- Desço já. Diz-lhe que aguarde um pouco. - Ajeita a alça do vestido e calça os sapatos pretos de salto. Volta a olhar para o espelho e tenta adivinhar quem poderá estar lá em baixo aguardando que ela desça.
Sai do quarto e ao chegar ao pé da porta vê a sombra dele. O seu coração pára por instantes. Pensa qual será o motivo que o traz a casa dela e de novo à sua vida. Recompõe-se e abre a porta.
- O que estás aqui a fazer? – sussurra para que Julieta e Gustavo não a ouçam na divisão ao lado.
Antes que ele lhe pudesse responder ouve-se a voz de Gustavo vinda da sala.
- Quem é Mafalda? Se não é urgente diz para passarem noutra altura, estamos a ficar atrasados.
- Um momento. – responde nervosa ao marido. Vira-se para ele e volta a perguntar, sussurrando. – O que fazes aqui?
- Vim ver-te.
- Ver-me?! – eleva a voz não se importando que alguém a oiça. - Não achas que já me fizeste sofrer que chegue? Como é que podes ter lata de aparecer em minha casa depois destes anos todos para me ver?! – protesta.
- Podes acalmar-te. – pede-lhe ele. – Vim ver-te sim. Não aguento mais este peso na consciência nem este aperto no coração. Quero-te ao meu lado. Sei que errei no passado, mas não sei o que será do meu futuro se não tiver comigo. – diz ele. Olha-a nos olhos e tenta alcançar-lhe a mão.
Ela desviando o olhar, afasta-se da porta e exclama.
- Tu tens noção do que estás a dizer?! Esquece que eu existo tal como eu fiz contigo. Deixa-me em paz.
Bate a porta sem se despedir, com o coração aos saltos e as lágrimas nos olhos. Sobe de novo para o quarto. Enquanto sobe as escadas diz para o marido:
- Gustavo, dez minutos e saímos. Liga à Joana e pergunta-lhe se ainda vai demorar. Vou só pôr rímel. *

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