Pieces * Saudade de ser

   Tenho saudades de ser transparente. De andar despida, mas sentir-me segura. Confiante em mim e nas minhas escolhas. É que dizer o que se pensa ou sente é mais difícil do que parece. Nem todos o conseguem verbalizar. Nem todos têm a coragem que é preciso. E por muito que seja deixar toda a gente entrar no nosso mundo, acaba por ser uma pré-selecção. Pois nem todos aguentam com a sinceridade. Nem todos conseguem admitir. Nem todos estão dispostos a despir-se e olhar-se ao espelho. Ver as suas falhas e imperfeições. Conhecer-se. Eu tenho saudades disso. De sentar-me e escrever, sem medo das consequências. De despir-me aqui e todos os dias. Dizer o que penso. Verbalizar o que sinto. Costumava ajudar. O que tirava de bom, era sem dúvida em maior número.
   As saudades são algo português. São o sentimento da falta. Necessidade de ter perto. Inexplicável vontade de partilhar momentos e verdades. Eu tenho saudades. Saudades do ontem. Porque o ontem já passou. Foi mais um dia em que me perdi de mim. Ficou tanto por dizer e fazer. Porque um dia só tem 24h. O que é isso? Não chega para nada. Com tantas perguntas e tão poucas respostas. Acumulam-se a cada dia que passa. Chega a sufocar. Chega a doer. Chega a vontade de dormir 24h para não aumentar a dúvida e a dívida. Por mais que procure. Por mais que encontre. Será sempre mais aquilo que está escondido, do que aquilo que se deixa descobrir.

   Agora posso voltar a respirar.

  

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